#37 A vida é como fazer Yoga, é difícil, dói, mas é bom
Reflexões sobre a vida enquanto faço a posição do cachorro
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Compartilho crônicas do cotidiano, reflexões sobre a vida a partir do meu olhar e minha experiência; comento sobre filmes, séries e livros.
Na sexta recebi um link e um convite para participar de uma aula gratuita de Yoga, precisava entrar no grupo do WhatsApp para garantir a vaga. Entrei, dei uma checada, fiquei pensando por um longo período se valeria a pena ou não acordar relativamente cedo em um domingo para isso.
Disse a mim mesma “bora lá manu, yoga é bom”. Aceitei o convite, surpreendendo minhas amigas que não acreditavam que eu fosse topar. Confesso que fiquei até com vergonha de negar, isso porque, a aula aconteceria há 300 metros da minha casa, e começaria às 09:30, o que não é considerado tão cedo.
Domingo amanheceu ensolarado e ventando frio.
Gosto muito de Yoga, não o processo em si, mas a sensação que ele proporciona no final da aula. A mente parece ficar mais calma, e o corpo alongado, consigo até alcançar os pés com facilidade.
Praticar Yoga é desafiador devido à variedade de posições disponíveis, cada uma exige equilíbrio e concentração. Existe a postura do guerreiro, da árvore, do cachorro, da vaca, qualquer animal ou elemento da natureza. Cada segundo em uma dessas posições parece uma eternidade. É como fazer 30 segundos de prancha.
Essa aula foi peculiar, pelo menos para mim, já que eu não conhecia Muladhara Chakra. Segundo a descrição no grupo do WhatsApp, "a prática será focada no elemento terra, promovendo estado de presença, acalmando a mente acelerada e proporcionando sensação de segurança, estabilidade, tranquilidade e plenitude através do equilíbrio de Muladhara Chakra, nosso primeiro centro energético.”
Até aí tudo bem. Durante a aula, a professora pede para ficarmos na posição de cócora e depois fala para contrairmos o anus, sugando toda a energia que vem da terra e a levando até o centro entre as sobrancelhas.
Ninguém ri em voz alta, talvez apenas mentalmente. Nessa hora não pude evitar pensar que alguém poderia estar segurando um peido, preocupado que, ao contrair o abdômen e o anus, o gás pudesse ir direto para o centro da sobrancelha, ou melhor, o terceiro olho, e isso poderia desregular os Chakras. Não sei se isso existe, mas foi uma dúvida que surgiu na hora.
Enfim, estava eu fazendo a posição de cachorro olhando para baixo. Dedos separados, ombros afastados das orelhas, barriga contraída, pés na distância dos quadris, coxas ativas, calcanhares em direção ao solo, caso fosse possível, e por fim, mãos firmes empurrando o chão. Enquanto fazia essa pose e sentia minhas pernas fritarem de tanta dor, me veio a mente o fato de que quase tudo que vale a pena na vida, passa por um processo difícil e doloroso.
Às vezes, parece que a dor é inevitável. Logo, se você nada sente, parece que não está fazendo do jeito certo.
Crescer e amadurecer dói! Sempre digo que são nossas escolhas que definem quem somos e nosso nível de maturidade. Como adultos, tomamos decisões o tempo todo, e escolher uma coisa significa abrir mão de outra, aceitando todas as consequências que essa escolha pode trazer. Requer muita coragem assumir tudo isso, ou necessidade.
Construir um novo hábito de vida é um processo muito difícil. Você não tem o costume de acordar às 6 da manhã, porque acordava às 8 todos os dias, mas para ganhar mais tempo, fazer uma nova atividade, ou algum outro compromisso, precisa fazer isso acontecer. Leva dias até que todo o seu corpo se acostume e você se sinta menos cansado e irritado com o horário. Passei por esse processo há alguns anos, precisei de muita disciplina e motivação, foi uma escolha minha, dolorosa no começo, mas me trouxe benefícios no final.
Adquirir o hábito de se exercitar é outro processo dificílimo. Seu corpo antes de ficar forte, precisa passar por aquele processo de adaptação de movimentos e peso. Para quem não está acostumado, 2 quilos pode parecer uma tonelada. O mais interessante é que, depois de você se tornar bom com aquele peso e repetições, você precisa aumentar, mais uma vez, todo o processo de adaptação, para não nos acomodarmos e sempre melhorar mais nossa performance, e isso vale tanto para quem quer alcançar algum objetivo estético, ou apenas para subir uma escada.
Como alguém que já foi concurseira, sei muito bem como é o processo de se preparar para um concurso. São momentos de muita tensão, angustia, solidão e um pouco de desespero. Claro que o que nos move é a esperança de dias melhores, de provas bem sucedidas, de um cargo que te proporcione segurança e boa remuneração. Fazemos escolhas e precisamos arcar com as consequências do processo.
Se você é alguém que deseja abrir uma empresa, ser dono de uma startup, também passará por esse processo de dor. Isso se você não for herdeiro, caso contrário, você viverá dias de muita luta com apenas 100 reais e um sonho no bolso.
Estou vivenciando uma transição de carreira já há alguns meses, e nesse meio tempo tive uma conversa muito sincera comigo mesma sobre o que eu estava disposta a aceitar para alcançar meus objetivos. Foi a partir dessa conversa que aceitei me submeter a situações que eu sabia que me levariam mais rápido ao meu objetivo.
Não gosto de romantizar trabalho, não acho saudável o trabalho excessivo e diário, mas no meu caso, eu aceitei trabalhar intensamente por um valor ínfimo, por causa da experiência que eu ganharia com aquilo. Eu estipulei um limite e um tempo para viver essa loucura que é sair aos poucos de uma profissão e conseguir outro trabalho, eu sabia que meu processo seria doloroso, e aceitei as consequências da minha escolha.
Por isso aceito passar por uma hora de dor no Yoga, porque eu sei que no final, vou me sentir muito melhor do que quando comecei.
Eu uso essa mentalidade para aguentar os segundos mais desesperadores do laser na minha pele. Porque não aceito meus pelos, então os submeto ao laser todos os meses e adoro o resultado de todo aquele sofrimento capitalista e patriarcal.
Foi esse mesmo pensamento que me fez criar coragem para descer um tobogã de 41 metros de altura, semelhante a um prédio de 14 andares, cuja velocidade da queda pode chegar a 100 km por hora. Se não adivinhou ainda o brinquedo é o insano, tobogã mais famoso do Brasil, localizado no Beach Park em Fortaleza. Quando desci aquilo, deixei uma parte de mim também, porque eu realmente pensei que ia morrer daqueles segundos que sucedem o início da descida.
Enquanto penso em tudo isso, me sinto meio coach, mas são só pensamentos aleatórios e profundos de quem está fazendo a quinta posição e sempre voltando para a do cachorro. Agora ela pediu para levantar uma das pernas.
Não tenho a intenção de entrar em assuntos polêmicos, ainda que necessários, mas desde já, não confundam essas dores com relacionamento abusivo, ou qualquer coisa relacionada a violência. Grata.
Eu amo fazer trilha, mas passo grande parte do percurso reclamando de absolutamente tudo. É um processo doloroso, pedras escorregadias, acessos por vezes estreitos demais, bichos… e olha lá, a vista é incrível mesmo.
Essa é uma das melhores metáforas para quem quer criar força e coragem para ir atrás de um objetivo, afinal, o caminho é difícil, mas a chegada faz tudo valer a pena.
O final de toda trilha faz a gente pensar em como a vida é bela, como a natureza é incrível e como é bom estar vivo.
Inclusive, faz mais de um ano que comecei a correr, mas só nesses últimos 6 meses que venho tendo mais constância, e correr é um processo difícil também, imagina ficar correndo por mais de meia hora só por correr? O esporte tem dessas coisas, todo um movimento, escolhas e caminhos que nos levam a um resultado, que às vezes é minúsculo, mas ainda é melhor que o da semana passada. A velha história: melhor a cada dia.
Depois de trocentas posições, baixei a perna, retornei a uma posição mais confortável e a professora nos mandou repetir tudo de novo, mas agora com o lado esquerdo.
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E eu que só pensava “Deus me livre de Yoga!” até fiquei curioso de ir tentar. Quem sabe aí consigo focar na mudança de carreira…